Mais uma
manhã. Sinto o sol pelas frestas da minha janela, preciso ir ao banheiro, mas
já não tenho forças para caminhar mais só, não quero fazer de novo na cama,
tomara que Celso venha logo.
- Bom dia,
pai, vamos para o banheiro, tomar bainho, esta um sol bom, vou colocá-lo para
tomar um pouco de ar.
Ah, filho,
assim eu penso... Sem falar nada pra ele. Tenho medo de magoá-lo. Por que você
não me ajuda a caminhar, Celso? Por que você me trata como um bebê? Me pega no colo, me senta no vaso sanitário,
me levanta, me dá banho, ainda bem que não põe essa sua mão nas minhas partes,
tô vendo o dia que vai pôr. Ah, menino, aí vou te dar uns tapas.
Fico aqui
sob o sol confabulando comigo, será que eles não sabem que consigo andar? Que
eu consigo falar também, tenho dificuldades, mas ainda consigo, eu consigo
pegar a colher para comer. Cristina, meninas! Tudo põe na minha boca, fora que
não sento na mesa com eles, ficam preocupados de eu cair.
As crianças,
que bom, vão conversar comigo.
- Oi, vô,
como o senhor tá cheiroso!
- Crianças,
deixa seu avô quieto, parem de encher o saco dele.
Ela fez isso
de novo, seria tão bom conversar com quem me entende.
- Pai, vou
te levar para o quarto, vou trabalhar, sua bênção.
Ele nem me
olhou eu o abençoando, que pressa.
Lá vem
Cristina com aquela papinha, colher na minha boca, passa o guardanapo, por
final me dá água.
Daqui escuto
todos na hora do jantar. Eu, ah! Já jantei, só estou escutando, como seria bom
se eu estivesse junto, crianças correndo pela casa, como eu queria...
Escuto uns
pingos d’água, como queria sentir os pingos no meu rosto, mas não posso,
ninguém nem imagina, mas eles jamais deixariam, posso pegar pneumonia. Ah! Como
sinto falta da minha véia! Pena que ela já se foi.
Amanhece de
novo e tudo de novo, só que hoje fiquei no quarto.
Filhos,
Filhos...
Lá vem a
menina com o almoço de novo, mas hoje...
- Pai, abre
a boca, vamos meu amorzinho, você precisa se alimentar. Pai, por favor.
Com
dificuldade...
- Filha, por
que você me trata como criança? Por que nunca deu a colher na minha mão? Por
que vocês me carregam no colo como um bebê?
- Pai eu
nunca quis te magoar, nem o Celso, a gente se preocupa, te amamos muito
paizinho.
- As
crianças me alegram, mas vocês as afastam de mim.
- Não, pai,
temo por eles fazerem algo errado e o senhor não gostar, jamais tive a ideia de
afastá-los.
- Vamos,
menina, tô com oitenta e cinco anos, mas ainda consigo pegar a colher.
Ali almocei,
enquanto ela me olhava com os olhos cheios de lágrimas.
- Obrigado,
filha, pelas preocupações. Estou orgulhoso de vocês, tantos idosos que são
deixados no asilo, mas vocês nunca desistiram de mim.
- Jamais,
meu pai, jamais. O senhor nos carregou no colo quando não sabíamos andar, o
senhor ajudou sempre a mamãe em nossos banhos, o senhor nos educou, nunca
deixou faltar nada.
- Agora
entendo porque me tratam assim, sinto muito Cristina, nunca parei para olhar
por este lado.
- Então
vamos combinar, minha filha, enquanto eu conseguir, você e seu irmão só me
ajudam, quando eu não puder mais, minha menina, podem continuar a cuidar de
tudo.
- Está bem,
pai, nos desculpe.
- Filha
querida, eu que peço desculpas, não tinha entendido seus cuidados, hoje dou
graças a Deus por ter me dado filhos maravilhosos. Amo muito vocês, nunca se
esqueçam, se chegar um dia que eu não puder falar, meus olhos falarão do meu
amor por vocês.
Edmary 12/11/2016
Edmary 12/11/2016
Lindo demais
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